domingo, 22 de dezembro de 2013

Natal, uma história de amor e fé

Acho muito oportuno a história criada por Léon Tolstoi sobre a origem do Natal, não pelo seu brilho catedral de decoração e troca de presentes, nem para agradar a cristãos e pagãos, mas pela simplicidade do acolhimento, uma atitude muito nobre em qualquer época do ano, independente da importância de quem será recebido em seu lar ou domínio.

Conta Tolstoi, que certo aldeão havia tido um sonho de que Jesus Cristo iria visitá-lo naquele dia. Para esperá-lo preparou uma saborosa sopa a base de repolho que tanto gostava. Acontece que neste dia tão importante, caiu de forma inesperada uma violenta tempestade de granizo e neve.

Vendo as condições ambientais do momento, constantemente, enquanto preparava a sopa, ia até a janela verificar se Jesus estava chegando, para abraçá-lo e em sinal de boas-vindas, aquecê-lo com o alimento que preparava com tanto esmero e alegria.

Nessa preocupação pelas condições climáticas e a certeza da chegada de Jesus, através da janela avistou ao longe na estrada um pobre vendedor ambulante, que conduzia às costas um fardo bastante pesado. Recebeu-o, alimentou-o e o aqueceu, só permitindo sua partida depois de constatado suficientemente forte para seguir sua jornada.

Passado algum tempo avistou uma mulher na estrada coberta de neve. Sem perda de tempo a levou para dentro de sua cabana, fez com que sentasse próximo à lareira, alimentou-a e a fez se embrulhar em sua própria capa.

Já desanimado com a chegada do tão esperado encontro com Jesus, de longe, percebeu uma criança que se encontrava perdida e quase congelada pelo frio. Da mesma maneira em que acolheu as outras duas pessoas, fez o mesmo com a criança.

Cansado e desolado, o aldeão sentou-se e acabou por adormecer junto à lareira. Mas, de repente, uma luz radiante, que não vinha da lareira, iluminou todo o ambiente. Quando surgiu diante de si, sorrindo o Senhor, envolto em uma túnica branca.

– Ah, Senhor! Esperei-O, o dia todo e não aparecestes, lamentou-se o aldeão.  Jesus lhe respondeu: - Já por três vezes, hoje, visitei tua cabana. O vendedor ambulante que socorrestes, aquecestes e deste de comer, era Eu! A pobre mulher, a quem deste a capa, era Eu! E a criança que salvaste da tempestade, também era Eu. O bem que a cada um deles fizestes, a mim mesmo o fizestes!

Portanto, O verdadeiro significado do Natal é a celebração do amor. Ajudar as pessoas que necessitam, prestando-lhes o auxílio necessário, mesmo que seja um simples sorriso. Estar em paz consigo, mantendo vivo a presença de Jesus Cristo em nosso coração, em nosso lar e estar sempre fazendo o bem. Por outro lado, saber reconhecer aqueles que verdadeiramente nos ajudam no dia-a-dia.

Um desafio que devemos abraçar sem o critério de seleção, é sermos fiel aos nossos amigos sinceros que caminham conosco e até dividem o peso da nossa cruz, para nos aliviar os ombros a fim de que recobremos as forças. Reconhecer e pedir perdão a alguém que por algum motivo tenhamos nos desentendido, magoado e ferido.

Vamos preencher nossa vida com atos de amor, fazendo outras pessoas felizes, fazendo deste Natal um momento inesquecível e permanente em nosso coração. É hora de estendermos as mãos, de perdoar, de abraçar. Conhecer com maior interesse e dedicação Aquele que deu origem ao Natal. Aquele que dá amor e alegria a milhões de pessoas.

O texto mensagem “Sabedoria”, que você irá se deliciar, não tem o mesmo sabor da sopa do aldeão russo, mas com certeza, o significado não se distancia. Contém nas suas nuances, exemplos que se considerarmos observando nossas limitações, nos faz sentir que em algum momento estamos de frente a uma encruzilhada sem solução, um tsunami pessoal, ou a uma tragédia grega existencial. Mas nada é insolúvel tendo Jesus Cristo ao nosso lado.

Aproveito para desejar a ti e sua família um Natal com muito amor e a presença constante de Jesus Cristo vivo na sua vida e no seu coração; nos seus atos e caminhadas; na digital do seu sorriso aberto e elixir de bondade. O Ano Novo. Ah, o Ano Novo! Que seja muito abençoado.

Caso achar conveniente, seu comentário será muito bem-vindo. Abraço fraterno, e vamos que vamos... Feliz Natal...!



Sabedoria


Conta-se que num país longínquo, há muitos séculos, um rei se sentiu intrigado com algumas questões. Desejando ter respostas para elas, resolveu estabelecer um concurso no qual todas as pessoas do reino poderiam participar.

O prêmio seria uma enorme quantia em ouro, pedras preciosas, além de títulos de nobreza.

Seria premiado com tudo isto, quem conseguisse responder a três questões: Qual é o lugar mais importante do mundo? Qual é a tarefa mais importante do mundo? Quem é o homem mais importante do mundo?

Sábios e ignorantes, ricos e pobres, crianças, jovens e adultos se apresentaram, tentando responder às três perguntas.

Para desconsolo do rei, nenhum deles deu uma resposta que o satisfizesse.

Em todo o território, um único homem não se apresentou para tentar responder os questionamentos. Era alguém considerado sábio, mas a quem não importava as fortunas nem as honrarias da Terra.

O rei convocou esse homem para vir à sua presença e tentar responder suas indagações. E o velho sábio respondeu a todas:

O lugar mais importante do mundo é aquele onde você está. O lugar onde você mora, vive, cresce, trabalha e atua é o mais importante do mundo. É ali que você deve ser útil, prestativo e amigo, porque esse é o seu lugar.
  
A tarefa mais importante do mundo não é aquela que você desejaria executar, mas aquela que você deve fazer.

Por isso, pode ser que o seu trabalho não seja o mais agradável e bem remunerado do mundo, mas é aquele que lhe permite o seu próprio sustento e da sua família.

É aquele que lhe permite desenvolver as potencialidades que existem dentro de você. É aquele que lhe permite exercitar a paciência, a compreensão, a fraternidade.

Se você não tem o que ama, importante que ame o que tem. A mínima tarefa é importante. Se você falhar, se omitir, ninguém a executará em seu lugar, exatamente da forma e da maneira que você o faria.

E, finalmente, o homem mais importante do mundo é aquele que precisa de você, porque é ele que lhe possibilita a mais bela das virtudes: a caridade.

A caridade é uma escada de luz. E o auxílio fraternal, é oportunidade iluminativa. É a mais alta conquista que o homem poderá desejar.

O rei, ouvindo as respostas tão ponderadas e bem fundamentadas, o aplaudiu agradecido.

Para sua própria felicidade, descobrira um sentido para a sua vida, uma razão de ser para os seus últimos anos sobre a Terra.

Conclusão: muitas vezes pensamos em como seria bom se tivéssemos nascido em um país com menos inflação, com menos miséria, sem taxas tão altas de desemprego, gozando de melhores oportunidades.

Outras vezes nos queixamos do trabalho que executamos todos os dias, das tarefas que temos, por achá-las muito ínfimas, sem importância.

Desejamos que determinadas pessoas, importantes, de evidência social ou financeira pudessem estar ao nosso lado para nos abrir caminhos.

Contudo, tenhamos certeza: estamos no lugar certo, na época correta, com as melhores oportunidades, com as pessoas que necessitamos para nossa evolução.

Pense nisso. Mas, pense agora.

Texto mensagem do Momento Espírita: Sabedoria, de autoria ignorada, publicado no mensário espírita O sol nascente, de setembro/2001, nº 390, ano XXXII e no verbete  Sabedoria, do livro Repositório de sabedoria, v. 2, pelo Espírito Joanna de Ângelis, psicografia de Divaldo Pereira Franco, ed. Leal. Em 13.2.2013.


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sábado, 14 de dezembro de 2013

O encontro perfeito


O trabalho literário da escritora e poetisa Brunah Gonçalves, tem muito a ver com o inegável talento do diretor de cinema Alfred Hitchcock - responsável por filmes de grandes sucessos -, aonde a trama vai sendo desvendada de forma progressiva ao longo da história, só se definindo cuidadosamente no final.

O suspense é a sua artéria aorta, e a sua criação temática é o diapasão em que se transcorrem as cenas, seu tônico o mistério. Como foi o caso de Psicose e os Pássaros – um assustador assassinato num banheiro e um chuveiro; e uma cabine de telefone envolvida pela fúria polvorosa dos pássaros aterrorizando uma indefesa moça.

Para o leitor que gosta do suspense, do mistério, do desenrolar indecifrável de uma trama capaz de te transferir para o ambiente da narrativa, num piscar de olhos, até mesmo de forma imperceptível e involuntária, “O Encontro Perfeito” de Brunah Gonçalves é uma belíssima opção para preencher o seu tempo com algo realmente interessante e arrebatador.

Embora as condições em que se encontra a personagem, estejam distantes de um convívio prazeroso de uma cidade iluminada, o pântano, ou até mesmo uma floresta macabra faz todo sentido.

Outro detalhe curioso e intencional do texto é a maneira que a escritora Brunah Gonçalves consegue dar na sequência da história, sem se perder e sem deixar escapar mínimos detalhes, como o clima e as sensações que envolvem o corpo de uma pessoa no momento do medo, do susto, do inesperado.

Sobretudo, em torno do clímax e o comportamento da personagem, deparando-se com insólitas surpresas que surgem de forma gradativa como uma tempestade ruidosa, e as situações tenebrosas e místicas do conteúdo a que se propõe delinear no decorrer dos acontecimentos.

Você deve conferir e se transpor para o inusitado. Tenho certeza de que o seu dia não será o mesmo e o habitual, o dia seguinte será, com certeza, seu retorno ao texto para conferir algum detalhe que por ventura não absorveu devidamente. Sendo assim, boa leitura e até amanhã. Vamos que vamos...!


O encontro perfeito


Eu só me lembro da neblina muito fria, que vinha não sei de onde... Tudo estava muito claro. Mas existia muita neblina que me impossibilitava de enxergar. Estava de pé, mas só me lembro de estar ali, de pé, olhando para a neblina e nada mais. Não me lembro do antes... De nada do antes. Eu era aquilo, eu era aquela, aquele momento... Nada mais.

Decidi andar... Fui caminhando sem saber o porquê e sem saber para onde. Só caminhei. Caminhei lentamente e apreensiva. Olhei para minhas vestes e era um lindo vestido branco. Comprido até aos meus pés, que estavam descalços. Sentia a areia fina debaixo dos meus pés, como uma areia de praia. Não sei se estava na praia... Eu não sabia de nada. Só seguia em frente e sentia tudo em minha volta.

Meus cabelos estavam soltos, levemente ondulados até minha cintura. Eram escuros. Não sei exatamente a cor, mas eram escuros... Segui, sentindo o frescor da areia, que não estava molhada. Segui... Meu peito começava a ficar apertado e minha respiração a ficar complicada. Não estava com falta de ar, mas o ar que eu respirava parecia pesado. Não existia cheiro ruim, existia apenas o cheiro de neblina. Ou, cheiro nenhum.

De repente - bem baixinho - comecei a ouvir alguma coisa. Vinha de longe, mas estava cada vez mais perto. Parei... Parei e fiquei com os olhos arregalados. Comecei a prestar atenção no som. Era estranho, pois eu não conseguia saber o que era. Era um som... Mas que tipo de som? Não sei. Minha cabeça estava pesada e a neblina atrapalhava o raciocínio.

O som foi ficando cada vez mais forte. Ele se aproximava de mim. Ele aproximava-se e eu começava a perceber que se tratava de uma música. Era uma melodia... Era uma linda melodia! Uma música de ar pesado, mas que trazia uma sensação de paz.

Estranho...! Um piano e uma linda voz rouca, o que dizia não sei. Não reconhecia aquelas palavras. Mas a música era linda. De repente, senti que ela me abraçava. Sim, a própria música me abraçava. Tirava-me para dançar.

Comecei a me mexer, ali mesmo onde eu estava. Minha mão foi levada por ela. A música me envolvia pela cintura e me fazia dançar. E, eu dancei... Dancei uma linda canção, com a própria canção.

O cenário era a neblina e o figurino não poderia ser melhor. Meu vestido branco, de tecido leve, se mexia delicadamente e me deixava graciosa. Não me via, mas eu me sentia e tinha certeza de que estava, realmente, muito graciosa. Então dançamos, nós duas, eu e ela: a doce e misteriosa canção.

Eu sorria... Era uma sensação tão maravilhosa estar ali. Estar em um lugar desconhecido, me fazia encantada. O desconhecido me deixava extasiada e inebriada. Não tinha medo de nada. Fui abraçada por um lugar. Sim, um lugar. E pelo vazio que se fazia cheio de beleza e leveza. Nada era pesado. Nem mesmo a voz rouca que trazia a canção, nem mesmo as batidas do piano e dos violinos. Que enquanto dançava reconheci que havia também o som do violino na canção.

 Não me lembro do antes. Nem me lembro se já existiu um antes. Mas tinha certeza de que aquela sensação, nunca havia sentido. Era a melhor sensação que poderia sentir. Maravilhoso, essa é a palavra que pode definir aquele momento.

De súbito, uma voz... Uma voz que não vinha da doce canção. Era uma voz de gente, como a minha. Uma voz aflita. Tive medo! A canção parou e eu fiquei com um leve aperto em meu peito. Um aperto de medo. A voz, de longe, mas não tão longe, chamava-me: Elizabete...! Elizabete...! Elizabete... E parou... Só me restou o eco, o oco, o nada...

O silêncio tomou conta do lugar por alguns instantes. Como se o silêncio estivesse ali para me fazer pensar: “a voz não me era estranha.” Mas, não me lembrava. Tentava lembrar, mas não conseguia.

A voz se foi e a canção retornou. Veio retomar a dança interrompida pela voz desconhecida. Meu sorriso voltou e a leveza também. Mas eu ainda não me esquecia da voz. Ela estava gritando em minha cabeça. Não sei, mas parecia que ainda me chamava.

Continuei a dançar. E flutuei... Flutuei de verdade. Fui parar em cima de uma pedra. Era uma montanha. Não tinha árvores, só o grosso da pedra úmida. A neblina também estava presente, sem me deixar ver nada mais que a própria neblina.

A neblina se abriu levemente e me mostrou um espelho. A música continuava, mas como pano de fundo. Agora... Agora eu estava a limpar a neblina do espelho. Eu era curiosa, Não sei por quê. Parecia que tudo que eu fazia era porque estava a obedecer pedidos de alguém. Não eram ordens, mas pedidos. Mas de quem...? Não sei. Realmente, não sei. Só sei é que aquilo, aquele lugar, me fazia bem.

Limpei o espelho e dei de cara comigo mesma... Era linda. Pálida, mas linda. Um ser gracioso, exatamente como eu havia imaginado. Um sorriso... Um lindo sorriso de mim para mim mesma. Me amei... Atrás de mim só tinha neblina... Meus olhos, tão puros e expressivos... A única cor que existia em meu rosto era o vermelho, causado pelo frio. Minhas bochechas e meu nariz fino estavam levemente rosados.

De repente, não mais que de repente, uma figura magra, branca, mas com uma roupa escura, surgiu atrás de mim. Fiquei a olhar pelo espelho. Minha boca ia se abrindo e meus olhos começaram a se arregalar.

Meu coração foi ficando com as batidas muito apressadas, aceleradas. Minha respiração vinha com tanta força que eu achei que estava a ponto de explodir. De ter um colapso, ou algo do tipo.

Minhas mãos estavam duras, minhas pernas bambas... E de repente, não mais que de repente, a mão daquela mulher estava em meu ombro. Uma mão magra e levemente fria... Eu senti um arrepio profundo, que vinha de dentro para fora e outro de fora para dentro. Achei que fosse desmaiar. Não sei como não desmaiei.

Era uma mulher. Uma linda mulher. Ela era um pouco mais alta do que eu e vestia-se com um lindo vestido longo, preto, de renda. Ela tinha olhos escuros e um rosto magro e pálido, com uma boca delicada, mas os lábios levemente grossos. Os seus cabelos eram escuros, com uns cachos delicados. Era linda!

Ela fez com que eu me virasse para ela. Ficou me olhando nos olhos, eu estava morrendo de medo. Meus olhos nem sequer piscavam... Mas, ela me disse: - Elizabete fique calma! - Como ficar calma? – Perguntei-me. Não consegui ficar calma. Ela se aproximou e beijou-me na testa. Senti seu beijo gelado, mas era um beijo macio... Então, com suas mãos segurando as minhas, me acalmei. A doce canção ainda rolava, mas, estava mais longe, mais leve, suave.

Suas palavras vieram a mim, com a mesma voz da canção, rouca e aveludada. Ela disse: - Não tenha medo, querida. Não precisa ter medo. Eu não farei nada com você. Continua: - Você veio até mim, então eu estou aqui. Estamos juntas. Mas, fique tranquila. Obedeci. Fiquei tranquila, ela me agradeceu com um lindo sorriso. Foi sintomática minha reação: retribui o sorriso.

Perguntei, mas minha voz saiu tremula, porém doce: - Quem é você? Que lugar é esse e... Desculpe... Não me lembro de nada.

Ela disse: - Você se lembra do que tem que se lembrar, querida Elizabete. Nada mais do que tem que se lembrar. Sou uma amiga... Sou sua amiga. Acredite em mim, minha querida. Sua voz era encantadora. Assim como a canção, que ainda existia. Sua voz era encantadora.

A voz que havia me chamado da outra vez, uma voz máscula, me chamava novamente. Chamava pelo meu nome. Era de longe que escutava a voz,

mas ela me causava certa angústia... Não sei bem explicar.

A mulher me olhou e disse, por entre um sorriso: - Você deve voltar. Sentirei sua falta Elizabete... Mas deve voltar.

Sem nada entender, questionei-me: - Voltar para onde? Que voz é essa que me deixa angustiada e curiosa ao mesmo tempo? Não sei se quero voltar para onde quer que seja, pensei.

A mulher, que não sei o nome, voltou a repetir agora ainda, mais enigmática: - Você deve voltar querida. Você entenderá tudo na hora certa, não 
se preocupe. Você deve voltar, pois você veio na hora errada. Volte para onde veio, e na hora certa retornará a este lugar e a mim.

Eu, totalmente confusa, assenti com a cabeça. E a mulher, me deu um forte abraço e um beijo na testa novamente e fez um gesto para que eu seguisse em frente. Eu segui em frente. E quanto mais eu seguia em frente, à voz máscula se aproximava de mim. Ou, eu me aproximava dela. É...! Acho que era eu quem me aproximava dela.

Olhei para trás, para ver se conseguia enxergar a linda mulher, mas, eu não via nada além da fria neblina. Então, voltei a olhar para frente. E a canção me acompanhava.

Depois... Depois não ouvi mais a canção. Não senti frio e nem vi mais a neblina. Só abri os olhos.

Abri meus olhos tão devagar... Eles pareciam que haviam ficado fechados por muito tempo. Será? Não sei... Ainda não sei. Quando abri os meus olhos, senti a voz máscula, bem alta, gritando: - Elizabete... Elizabete, meu amor, você voltou. Graças a Deus!

Era um homem loiro e de olhos claros (Azuis). Ele segurava minhas mãos.


Aos poucos fui recordando de tudo: Do lugar onde estive; da neblina, da canção e da linda mulher. Lembrei-me também do que havia acontecido antes de ter chegado naquele lugar.

Agora, me encontrava deitada na areia da praia. O homem que estava ali, ao meu lado, era o David Miguel, meu o marido, com o qual, havia acabado de me casar e naquele momento, estávamos em lua de mel.

David Miguel beijava-me a testa e os lábios... Alguém vestido de branco, provavelmente um médico, colocava-me deitada em algo macio, transportando-me para dentro de um carro.

Nesse momento comecei a perceber com nitidez o que havia ocorrido. Foi um acidente. Estava com meu marido num Jet ski. Íamos à grande velocidade rumo a uma ilha. Riamos muito, quando ele se distraiu e descontrolou-se e batemos numa pedra.

David não sofreu quase nada, mesmo tendo nós batido de costas a uma enorme pedra. O Jet ski, rodopiou até bater com a traseira na pedra. Fui mais gravemente atingida. Ele só sofreu leves fraturas. Mas eu... Eu fiquei desacordada por cinco horas. Com sangue a escorrer pelo meu rosto.

Cheguei ao hospital, fui medicada e colocada em observação. Meu estado ainda era grave, mas tinha consciência de tudo. Minha cabeça doía muito, mas me lembrava de tudo... Lembrava-me daquela mulher... Não podia esquecê-la.

Lembrava-me da morte. É...! Eu fiquei amiga da morte, estive com ela, 
dancei com ela, escutei sua voz... A morte não me causava medo, ela me amava. A morte me amava tanto quanto a vida. A vida não me deixou partir, porque a vida me ama também.

A morte, essa me ama tanto, que me permitiu viver. Sabia que eu precisava viver mais, porque David esperava por mim em vida, que eu o amo e preciso dele. A morte provou que me ama, mas provou acima de tudo, que preciso viver. Amo a vida! Mas passei a amar também a morte. Amo a morte, porém preciso viver. Encontrei-me com a morte na hora certa.

A lembrança do meu encontro com a morte é tão boa, que irei recordar desse encontro para sempre. Mas não deixarei que essa lembrança tome conta de mim, pois tenho uma vida que precisa ser vivida com todo amor que tenho por ela.

David... Sinto neste momento, que ele me olha, do lado de fora do quarto, e sinto também, que eu o amo muito. Adormeço e não sinto mais nada. Dessa vez não irei me encontrar com a morte, só irei dormir e descansar, para depois acordar com mais força, com mais vida.


Por: Bruna Gonçalves (Escrito em: 27/11/2013).
Enviado por Brunah Gonçalves em 27/11/2013
Reeditado em 27/11/2013
Código do texto: T4588625
Classificação de conteúdo: seguro.


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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Diário de Um Delirante

Eu não sei, porque nunca passei por esta situação: letargia, delírio, ou algo parecido... Mas creio eu, que a sensação de letargia profunda, não nos leva a lugar algum. Nem mesmo em pensamentos. Estaremos como mortos. Lógico, que são apenas suposições. Como disse, não conheço esse estágio mental.

Já li vários romances evidenciando o espiritismo, onde as pessoas se transferem do próprio corpo e se encontram em lugares nunca antes presenciado, ou em lugares que, talvez, através de sonhos possa tê-los visto. Mas também, estou me referindo de forma hipotética. Nada concreto... Com lógica.

O Conto “Diário de Um Delirante”, do escritor Pedro Henrique Baima Paiva, foca a situação em que uma criança num desses momentos de delírio, vaga por lugares fantásticos e improváveis. O seu conteúdo não tem a pretensão de mostrar, caracterizar, criar tese e nem mesmo causar um burburinho em torno de uma realidade aturdida.

Contudo, é interessante viajar pelos lugares e situações onde se transcorre a narrativa. As surpresas vão criando vida, uma após outra, e é aí que o improvável habita. Em determinado momento, você se sente presente nas cenas, até sentindo os sintomas de espanto e perplexidade com tanta flutuação de símbolos e elementos que uma mente talvez normal, não seria capaz de registrar. Isto, levando-se em conta o realismo subentendido dos fatos.

Tenho que admitir que dos inúmeros autores que tive a oportunidade de ler, ainda não havia lido um texto como este “Diário de Um Delirante”. Sabe aquelas histórias de desenho animado, onde o bem e o mau se confundem? Melhor ainda, lembra-se do livro, ou do filme o “Maravilhoso Mágico de Oz”, de L. Frank Braum, em que a personagem Dorothy Gale encontra com os seus três novos amigos em busca de soluções com o Feiticeiro de Oz?

Outra obra literária que nos remete ao Conto do Pedro Henrique é Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Onde o personagem Chapeleiro Maluco, só se expressa por meio de enigmas. Enfim, o Conto “Diário de Um Delirante”, fará você fazer uma viagem interessante pelo mundo do surreal. Recomendo com todas as letras sua leitura. Seu comentário será bem-vindo. Vamos que vamos...


Pedro Henrique Baima Paiva é biólogo pela PUC Goiás; MBA Marketing pela Uni Anhanguera; é graduado em Ciências Sociais e Políticas Públicas pela UFGO; palestrante sobre sustentabilidade; servidor efetivo da Agência Municipal de Meio Ambiente de Goiânia; e Professor Universitário.



Diário de um delirante



Eu tinha apenas 12 anos a primeira vez que vi o jardim. Meus pais sempre visitavam aquele país da América do Sul. Um país exótico e ensolarado, com pessoas risonhas que caminhavam puxando seus carrinhos de compras e conversavam entre sonoras gargalhadas.

Para um garoto acostumado com o gelo como eu, aquele matiz de cores proporcionado pelos raios do sol, impressionava muito. Na última vez que voltamos juntos, porém, um trágico acidente marcou nossas vidas para sempre, e a minha talvez mais que a de todos.

Voávamos há horas e nosso destino já se agigantava no horizonte quando uma estranha descarga elétrica acertou o avião que em pane despencou do céu em um espiral de fumaça e terror. O fogo foi visto primeiro, depois escutamos as explosões, três que me lembro. E na última delas senti meu corpo ser agarrado e jogado para fora do aparelho.
Tudo aconteceu muito rápido e a partir de agora leitor, desconfie dos fatos extraordinários que vou contar, pois até para mim parecem invenções de uma mente perturbada pelo medo e desespero frente à morte eminente.

Minhas lembranças da queda em si são muito confusas, pois em meu delirante salto para o chão um arquipélago me esperava para esborrachar. Mas quando isso aconteceu, eu acordei em cima de uma folhagem tão densa que tive que deixar meu casaco para me livrar dos galhos torcidos, que com um efeito de molas amorteceram meu impacto fatal. Caminhei alguns minutos, porém, não tinha nem sinal do local onde o avião havia caído. Onde provavelmente era agora o túmulo dos meus pais.

Extasiado, com sede, sentei na sombra de uma flamejante árvore de trocos retorcidos e flores com pétalas vermelhas como o fogo. De sua copa caíam grandes cápsulas onde amadureciam suas sementes. Em seus galhos, pássaros multicoloridos saracoteavam como num jantar de comadres.

Eles não estavam sozinhos, ao pé de outra grande árvore próxima de mim, agora se destacavam entre as folhas secas, serpentes rajadas que brilhavam como uma pulseira de brilhantes. Lagartos, insetos, mamíferos. Era uma inimaginável reunião de animais que parecia insana para mim. Entre cores e cantos, entoava uma bela melodia e o vento trazia a mais deliciosa combinação de aromas, que o meu nariz nórdico havia alguma vez experimentado.

Como em uma dança selvagem, todos os animais seguiam em fila indiana para um aglomerado de rochas próximo, e com batidas ritmadas produzidas por seus pés no chão, pareciam dançar uma coreografia animalesca.

O ambiente mágico que se fez em minha volta camuflou o motivo de eu estar ali e me despertou uma sensação que não posso com palavras explicar. Ao que parece, logo estava eu naquela fila medonha de animais dançando um tipo raro de mantra, produzido pela soma de todos os sons juntos à minha volta.

O clímax daquela sandice produzida pela minha mente em choque parecia se aproximar, quando um gambá com uma longa calda e pelos brancos em cima dos olhos, se levantou em duas patas e como um cortesão recebeu todos ali, com uma longa e engraçada reverência. Com a mão esquerda estendida nos encaminhou para uma fenda na rocha, que eu ainda não havia reparado.

Era como um grande portão sólido, adornado com inscrições entalhadas na pedra. Não sei que língua era aquela, mas seus símbolos pareciam reluzir à luz do sol e combinavam como uma senha mágica, que se repetia como luzes de Natal. Ainda em fila, fomos todos adentrando aquelas rochas. Naquele momento, eu já não sabia se estava sonhando ou estava realmente ali, com todos aqueles bichos.

Na minha frente, um grande macaco dava o ritmo, fazendo um som grave com sua garganta, no compasso daquela canção. Perto dele um sapo preenchia o som com seu coaxar. E mais adiante besouros tremiam suas asas dando um efeito especial à música. Todos ali participavam de alguma forma. Lá dentro, senhoras e senhores em frenética agitação, saltavam aos olhos.

Cercado pelas pedras monumentais, nada mais havia ali, senão o mais exuberante jardim já conhecido na Terra. Uma aquarela de cores se espalhava por uma vasta área. Meu Deus! Como era enorme! Meus olhos se encheram de imagens de árvores antigas, como aquela própria ilha esquecida no oceano.

Frutas nunca vistas antes pendiam dos galhos fartamente abastecidos. No meio daquele vale corria um límpido rio, de águas calmas que só se agitavam com o fuzuê dos bichos, que se refrescavam em suas margens.

A vida ali era tranquila. Estava refletido nos olhos de todos. As flores espalhadas por toda a área se exibiam, ainda, com as gotas do orvalho sobre suas corolas cintilantes. Em volta de uma magnífica cachoeira, festejada por vários animais.

Eram tamanduás, macacos, patos e ao que parece, até uma onça pintada, que como conchas, usavam às suas duas mãos para derramar aquela água sobre suas cabeças, e depois como se brincassem todos juntos, molhavam-se e mergulhavam-se diante daquele véu de noivas formado pelas águas e a espuma daquela maravilhosa queda d’água.

Revoadas de pássaros faziam uma bela apresentação no céu que parecia uma pintura de tão azul. Nesse momento parece que o artista inspirado numa ópera de Tchaikovisky, compunha um iluminado balé, aplaudido pelos seus giros fantástico, com a magia magistral do seu pincel, tornava-se visível na tela, outra pintura surreal, embelezada pelas poucas nuvens que flutuavam aqui e acolá.

Antes de caminhar em direção da cachoeira, onde a reunião se formava me ajoelhei na margem do rio, e sorvi um delicioso bocado daquele líquido generoso que Deus nos deu, o qual revigorou o meu espírito. Senti uma estranha sensação percorrer meu corpo como se sob efeito de algum elixir sobrenatural, que dá energia e uma inexplicável paz no coração. Não resisti, e em gargalhadas e muita felicidade pulei dentro do rio e me banhei feito a uma criança que era.

Depois de um tempo que não sei precisar, saí dali e percebi que os animais faziam mais uma vez fila. Mas agora de volta ao portão em que entramos. Perto da cachoeira, a reunião de animais começava a se desfazer, quando eu vi entre corpos, aquele anjo penetrar uma caverna escondida por detrás das águas. Não sem antes dar uma olhadela em volta, e com um sorriso carinhoso de despediu.

Só o vi por alguns segundos, mas posso descrever que não existia ali nenhuma criatura que imitasse sua beleza. Pele branca como o leite, seu lindo corpo formava uma silhueta perfeita. Longos cabelos negros encaracolados lhe caíam sobre os ombros e seus olhos eram cheios de paz, ternura e amor.

Extático com tamanha beleza, não consegui mover uma músculo do meu corpo. Depois disso não me lembro de mais nada. Quando abri meus olhos, já estava na cama de um hospital, onde mais tarde fiquei sabendo que estavam também meus pais. Todos nós estávamos vivos. Ôbaaa!

Muitos anos depois li em um livro velho, a história de uma rainha que um dia construiu um lindo jardim, e por conta da ganância e cobiça dos homens que o queria, ela e seu jardim um dia, sumiram diante dos olhos de todos como mágica.

Antes de se dissipar no ar, a rainha jurou que o precioso jardim nunca seria descoberto pelo homem. E o segredo para achá-lo há muito havia sido perdido: “O amor e o respeito pela natureza.”


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domingo, 24 de novembro de 2013

O Homem Só

 
A realidade é uma verdade que não permite erros. Quando estes ocorrem o preço é muito alto a se pagar. Porém, entre centenas de seres que transitam na imensidão do desconhecido, ou mesmo das descobertas. Às vezes, os levam a conhecer o improvável. Inicia-se aí, sua luta ferrenha para sobreviver. Tanto no aspecto moral como útil. De ter uma vida digna. Ser amado e respeitado por seus familiares e amigos. Ou então se amargar na contramão da escabrosa sobrevivência no mundo da ilusão, da surreal floresta do esquecimento. Subtraído do convívio social em consequência de um dilúvio mental.

Nome - o seu nome - deixará de ter significado até para o Censo Demográfico. Sua existência passa a não ter sentido, nem através da sombra. Porque, o sol deixou de brilhar sobre os seus ombros há muito tempo. Nada resta senão, repetir um ritual diário, sem sentido algum para continuar vivendo. Pelo menos, aquele em que está deparando frente a frete e tendo de suportá-lo, apenas para concluir seu designo de existir.

As clínicas de doentes mentais, de drogados, de recuperação da autoestima e aconselhamento na busca de uma vida melhor e mais saudável, estufam os bolsos dos seus responsáveis, sem uma resposta plausível e iluminada, capaz de modificar esse quadro triste, embora muito verdadeiro.

Enquanto, a venda que cega a sociedade, principalmente em relação ao descaso existente nos meios capazes de fazer algo notável e louvável, ou pelo menos tentar encontrar uma solução humana para o problema no sentido mais amplo, não passa de pura utopia.

Bússola Literária, através de um bem focado Conto: “O Homem Só”, de Renata Rothstein, nossa amiga do Facebook. Analisa o assunto, nos dando a dimensão do abandono em que uma pessoa, esquecida à própria sorte. Distante de si mesma, é obrigada a se submeter a mais absurda renúncia, esquecido até da sua origem. Sobrevivendo apenas de vagas lembranças que ainda se movimentam pelo cérebro ignoto, remoendo anos de total orfandade.

Neste Conto, que mais parece um monólogo ditado por um anjo da guarda, desvenda a tristeza de uma pessoa que convive com o seu anonimato absoluto, e ainda assim, alimenta uma possível esperança, que há de iluminar o fim das incerteza.

Recomendo sua leitura, porque sei que um dia, ouviu contar um fato semelhante, ou até mesmo, presenciou por se encontrar próximo desta inóspita e insólita realidade. Boa leitura. Caso achar conveniente, seu comentário será muito bem-vindo e motivador. Vamos lá...


O Homem Só


Era um homem só. Apenas um solitário homem cansado. De tanto pensar, pesar os prós - Que prós? - e os contras, pesar os pesares e pesar a vida, esqueceu que havia um passado. Outra vida, que tinha vivido. Que tinha, enfim, desabado, desabafado, acabado. Passado (?). 

Despercebido anos no vício - que não era vício, no singular, era pluralíssimo - como ele, como a chuva, como o deserto. Tal e qual as pessoas ditas normais, que corriam lá fora. “Atrás do que e para onde?” Ele se perguntava, ignorando que nem elas saberiam a resposta. Mas, não estavam nem aí, para falar a verdade.

Verdade, uma mentira. Desperto em si, deserdado de si, entediado como um poodle rosa, de madame com cabelo a caju, ele só esperava a noite, a liberdade, a rua e o céu, o seu belo telhado. Ao menos era o que quase sempre escolhia. O que lhe acolhia, ou o que era obrigado a recebê-lo, quando era expulso, aos bofetões, por algum senhor zelador da ordem. Irritado porque especialmente naquele dia, ele não estava - para variar - no seu juízo perfeito.

O fato é que em um triste dia, este mesmo homem imperfeito saiu, sem destino e com pressa. E rua afora procurava louco e irreconhecível, na sua desconhecida apagada saudade, um sonho, do qual achava, havia participado.

Mas as ruas surgiam, uma após outra, esquinas sem nome escondendo lembranças e recordando nomes que o homem não queria saber, mas que teimavam em soprar-lhe nos ouvidos, sempre atentos às vozes que não existiam: "mamãe... Lucélia. João, o meu pai. Hélio, o Helinho, meu amigo de infância. Isaura..." Sobressaltava-se, ao ouvir a voz inexistente, tão sua conhecida, sussurrar esse nome.

Isaura Gomes, a mulher dos seus sonhos reais, quase palpáveis, naqueles instantes de lembrança. Isaura, seu único, grande e definitivo amor. Aquela que fora capaz de levá-lo ao céu e entregá-lo ao inferno, sem data para retornar e buscá-lo.

Lembrava-se mesmo vagamente dos cabelos pretos e ondulados, da voz quase irritante, do semblante selvagem de quem lutou muito para chegar até ali. E não podia perder tempo com um louco.

Louco! Louco! Louco! Louc... A voz... Agora, ria-se dele e homem só, que, aliás, atendia pelo nome de Armando. Apertava a cabeça com as costas das mãos, como  algum tipo de feitiço para afastar as vozes.

Acalmou-se, e, como um carro se afastando na estrada e sumir no horizonte, lembrou. Uma lembrança que era quase uma intuição, daquelas que nem se sabe se é lembrança, sonho, viagem. Lembrou...

Amara Isaura. Amara... Será mesmo que amara? Ou era o amor uma farsa, um pretexto para acabar. Desafiar e levá-lo ao fundo do poço de uma vez por todas. Tudo aquilo, ele fazia enorme esforço por acreditar.

A cabeça de Armando nessa hora era só metade. Aberta para enxergar todos os dissabores da vida - que ironia, chamar "isso" de vida. Nos poucos momentos de paz; nos menos que eram muito, muito mais...

Dormiu, ao relento. O vento espalhando um resto de pensamentos e um varredor invisível de sonhos juntando tudo num canto, apontando e dizendo: "Aí os teus sonhos, meu chapa. Se quiser pode pegar. Eu não pegaria..." Foi o conselho. Armando seguiu, achou melhor.

E irrefletidamente durante anos, esse resto de homem perdeu tempo. Do tempo que ele não tinha. Esgotando-se no desperdício indecente, inclemente, como gota d'água fugindo do oceano, cantando a delícia de partir, com a missão cumprida. Já não importava a sorte, a morte, uma promessa ou uma missão mal resolvida.

No sanatório só deram falta de Armando no quarto dia, procuraram mais três... Fecharam a semana: sete dias. Sete, este é um número cabalístico. Esqueceram de vez de Armando. O homem solitário de terno surrado e passado desconhecido, que - diziam - estava mesmo irremediavelmente perdido, desde que aparecera por ali, trazido por um serviço de recolhimento de moradores de rua.

Durante muitos anos essa foi a sua única, úmida e tangível falta de sorte.

O adeus, o corte, o misterioso sumiço daquele insensato homem que, embora desaparecido da visão de todos, continuava existindo, pensando, sumindo e morrendo. Em algum canto da via de estrelas, lá fora. Ou dentro, no seu mundo, hoje perdido. Um passatempo de acordar e dormir, viver, sem jamais ser.

Como tantos Armandos, fingindo... Fugindo e morrendo. Continuando, vivendo.

Uma noite o homem só fechou os olhos e acordou com uma voz, quase irritante, chamando baixinho seu nome: “- Armando...!"  Abriu os olhos e viu os cabelos negros... O semblante, agora bem mais suave. Era Isaura. 

Estendeu-lhe as mãos de dedos finos e ele se levantou. Não perguntou nada, só obedeceu.

Gotas de chuva transparente e que não molhavam (estranho) caíam sobre ele. Sentiu-se, simplesmente, parte de tudo o que não compreendia. Partiu rumo à rua, rumo ao céu. A liberdade, enfim...


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