sexta-feira, 26 de março de 2010

Chico Xavier, o detetive do além














Impressionante! Vai notar neste artigo que até o jornalista David Nasser se surpreendeu com a humildade de Chico Xavier. Não tem como imaginar qual foi sua intenção ao se propor a divulgar a vida do médium mineiro, porém, sua simpatia discreta o conquistou. Neste conteúdo veremos a opinião dos moradores da pacata Pedro Leopoldo sobre as revelações do homem que revolucionou o espiritismo brasileiro em toda sua plenitude e a sua missão como esperança reveladora. Muito bom!

Texto extraído do link da revista O Cruzeiro de 12/08/1944, no site Memória Viva. Regras ortográficas da época.





Chico Xavier, o detetive do Além
Texto de David Nasser e Foto de Jean Manzon.





Era uma vez um moço ingênuo e feliz, vivendo numa cidadezinha ingênua e feliz, perto de Belo Horizonte. O moço se chamava Francisco Cândido Xavier e não desmentia o nome. A cidadezinha, Pedro Leopoldo, arrastava suas horas de doce paz, entre as missas de domingo e a chegada do trem da capital. Não se sabe como, numa noite ou num dia, Chico se mostrou inquieto e desandou a escrever. Terminando, disse, apenas, à família assustada: - "Não fui eu. Alguém me empurrava a mão". Desce êsse dia ou essa noite, Chico Xavier perdeu o sossêgo e também o de sua cidade. Turistas chegavam, atraídos pela fama do moço-profeta. Pedro Leopoldo ia crescendo e Chico Xavier ia ficando importante. Nunca mais teve paz. Nunca mais pôde sair pela rua, sem ouvir um pedido de saúde ou uma prece de gratidão. Se ao menos fôsse só isto. Era mais, muito mais. Eram os curiosos do Rio, de São Paulo e de Belo Horizonte, pedindo consultas ou detalhes pelo telefone interurbano. Era a legião de repórteres em busca de novas mensagens. O representante da editôra insistindo por outros livros. Os centros espíritas de todo o país solicitando pormenores. Uma vida infernal, agitada, barulhenta sacudia o pobre rapaz.


As luzes dos lampiões da cidadezinha nunca mais dormiram sem a presença de um estrangeiro, rondando pelas ruas dantes tão sossegadas.


Fixaremos, precisamente, a violenta mudança de vida de Chico Xavier e da cidade de Pedro Leopoldo. Não nos interessa, embora pareça estranho, o medium Chico Xavier, mas a sua vida. Os seus trabalhos psicografados - ou não psicografados - já foram assunto de milhares de histórias, divulgadas desde 1935. Se são reais ou forjadas, decidam os cientistas. Se êle é inocente ou culpado dirão os juízes. Se êle é casto, instruído, bondoso, calmo, diremos nós. Porque não somos detetives do além.


Se os espíritos nos ouvem, êles sabem que não acreditamos em suas mensagens, nem desacreditamos de suas virtudes literárias. A verdade é que não temos a bravura indispensável para avançar sôbre o terreno pantanoso do outro mundo e analisar suas reais ou irreais comunicações utilizando aparelhos de escuta com êste pálido e sensitivo Chico Cândido Xavier. Desde que saímos daqui, levávamos a inabalável determinação de fazer uma reportagem sem complicações, apesar do assunto em sua natureza extra-terrena mostrar-se absolutamente complicado. Assim é que o senhor, amigo, chegará ao fim destas linhas sem obter a certeza que há tanto tempo procura: "É Chico Xavier um impostor ou não é?" E dirá: - "Não conseguiram desvendar o mistério!" Sim, o mistério continuará por muito tempo. Eternamente. E Chico Xavier morrerá, sem revelar o segrêdo de sua extraordinária habilidade ao escrever de olhos fechados, se é mágico, ou de seu fantástico virtuosismo, ao chamar, além das fronteiras da vida, as almas dos imortais, fazendo-os recordar os velhos tempos da Academia. Nossa intenção é mostrar o homem. Sem o espírito dentro de si, nos momentos vulgares, Chico Xavier é adorável, cândido, maneiroso, humilde, um anjo de criatura. A frase de uma vizinha define melhor: - "Sabe, moço? O Chico é um amor". Justamente dêsse tipo desconhecido, da parte anônima de sua devassada vida, é que tratamos, na hora e meia que permanecemos em Pedro Leopoldo. Para começar, diremos que Chico nunca teve uma namorada.


O tempo de viagem de Belo Horizonte a Pedro Leopoldo não vai além de hora e meia. A meio caminho, encontramos a fazenda federal onde Chico Xavier é dactilógrafo. O motorista não quer entrar. - "Aí, não. Até os zebus são atuados". O diretor, Rômulo, está na horta, sòzinho. Êle nos dará, talvez, esclarecimentos sôbre a vida de Chico e, quem sabe, facilitará o encontro com o sensitivo. Ouve o pedido. Depois, lentamente, abana a cabeça e o seu "não" é inflexível, desde o primeiro minuto. Alega um milhão de coisas. Que Chico anda cansado e precisa repousar. Um de nós lembra a possibilidade dêle, diretor, dar umas férias a Chico. - "O Chico funcionário nada tem a ver com o outro Chico". Apresentadas as despedidas, êle adverte: - "Não creio que será possível aos senhores um encontro com êle. Creio que vão esperar até sexta-feira".


Voltamos a deslizar pela estrada, neste sábado negro. A cidade aparece depois de uma curva. - "Onde fica a casa do Chico Xavier?" O menino aponta a igreja. - "Ali, na rua da matriz. Ele mora com a família". Encontraríamos, em várias oportunidades, a mesma designação do pessoal do município: êle. Todos apontavam Chico, sem recorrer ao nome. Êle só podia ser êle. - "Minha irmã foi curada por êle".


Ei-lo aqui, diante de nós. Veio a pé da fazenda e em sua companhia um senhor do Rio, que algumas vêzes vem passar semanas com o medium. - "Gosto de falar com êle. É um rapaz de cultura. Discute vários assuntos, lê um pouco de inglês e de francês. Devora os livros com fúria. Trouxe-lhe, há dias, "O homem, êsse desconhecido" e êle não gastou mais de quatro horas e meia para ler o volume gordo. É um prazer para êle. Seu único amor é o espiritismo".


Chico, perto de nós, não está ouvindo a palestra. Conversa com Jean Manzon. Devemos esclarecer que não dissemos qual a organização jornalística em que trabalhávamos. Queríamos ver se o espírito adivinhava. Não houve oportunidade.


Chico parecer ser um bom sujeito. Suas ações, mesmo fora do terreno religioso pròpriamente dito, são ações que o recomendam como alma pura e de nobres sentimentos. Vão dizer, os espíritas, que é natural: todo o espírita dever ser assim. Sei de um que não teve dúvida em abandonar a espôsa, o lar, sete filhos, um dos quais doente do pulmão.- "Na rua, entre seus irmãos de seita, - disse-me um dos filhos - êle se mostrava esplêndido, generoso, cordial. Em casa, por pouco não botava fogo nas camas, à noite. Parecia um verdadeiro demônio. Guardava até alface no cofre-forte”.


Já o Chico não é assim. Sua nobreza de caráter principia em casa. Todos os seus irmãos e irmãs louvam a sua generosa e invariável linha de conduta, protegendo-os, hora a hora, dia a dia, através dos anos, trabalhando como um mouro. Um de seus sobrinhos sofre de paralisia infantil. Atirado a um berço, chora eternamente. Sòmente o Chico vai lá, fazer companhia ao garôto, às vêzes uma noite inteira.

- Chico!- Que é, meu senhor?
- Você lê muito?
- Não. Só revistas e jornais.
- O outro disse...
- Disse o quê.
- Nada.

Êle nos olha, surprêso, quando a pergunta, como um busca-pé, sai correndo pela sala:

- Você, não pensa em se casar, Chico?
- Eu, casar? (Dá uma gargalhada)
- Claro que não.
- Não namora?
- Nunca.
- Por que?
- Não há razões. Não gosto. Tenho outras preocupações. Ora, eu namorando... Tinha graça...
- Chico...
- Que é?
- É verdade que o padre desafiou você para um duelo verbal?
- Êle disse pra eu ir à igreja discutir. Não é lugar próprio.
- Você gosta do padre, Chico?
E êle, o ingênuo e feliz Chico, respondeu:
- Ué, eu gosto do padre, mas êle não gosta de mim.
- Chico...
- Que é?
- Onde estão suas mensagens?
- Um irmão levou tudo, em vista de tantas complicações.
- Você vai ao Rio?
- Até agora, nada resolvemos. Possìvelmente, mandarei uma procuração.


Numa estante, os livros de Chico. Versos de Guerra Junqueiro, Tolstoi e uma porção de autores mortos. Na sala do lado está a mesa onde êle recebe as mensagens. Uma papelada branca, pronta para ser coberta pelas mensagens do outro mundo. Sexta-feira houve mais uma sessão, desta vez presidida pelo chefe do executivo municipal. Humberto de Campos não compareceu mas o Emanuel, guia de Chico, lá estava. Quem é Emanuel? Um romano que existiu na mesma época de Jesus e conta um mundo de coisas interessantes sôbre a terra, naqueles tampos de há dois mil anos.

- Êle dita?- Vou psicografando as mensagens. Há outros mediuns, como um norte-americano, que ouve as vozes dos espíritos tão alto que os presentes também escutam. Eu ouço. Os outros, que estão perto, não.
- Chico...
- Que é?
- Já teve oportunidade de falar com espírito de homens célebres?
- Homens célebres?
- Napoleão, para um exemplo, já falou consigo?
- Que eu saiba, não. Os assuntos bélicos não são freqüentes, nas mensagens que recebo do além. Há seis anos, entretanto, meu guia Emanuel previu os principais acontecimentos que hoje revolucionam a terra. Êle disse:
- "A vitória da fôrça é fictícia".

O cavalheiro do Rio acode:
- E o próprio Chico, meses antes, previu a queda da Itália. Êle disse, categòricamente, que a Itália seria a primeira a cair. E a Itália foi a primeira a cair.


Pedro Leopoldo é a cidadezinha de uma rua grande e uma porção de ruas pequenas, convergindo para ela como servos humildes do rio principal. A casa de Chico é uma das melhores do lugar. Três quartos, sala e cozinha. O banheiro é lá fora, no fundo do quintal, ao lado do galinheiro. Chico se levanta de madrugada e vai dar milho às galinhas. Depois, sua irmã solteira faz o café, que êle toma com pão dormido, porque o padeiro ainda não chegou. Apanha a pasta de documentos da fazenda federal, e vai andando pela estrada, ainda coberta pela neblina. Volta para almoçar às onze horas. O expediente se encerra às dezoito horas, mas Chico, nestes dias de maior trabalho, faz serão. Sua vida é frugal. - "Quero que compreendam o seguinte: não vivo das mensagens de além-túmulo. Tenho necessidade de trabalhar para sustentar minha família. Se quase me dedico inteiramente a receber as comunicações, ainda se entende. O pior, entretanto, é a onda de gente que vem do Rio, de São Paulo e de todos os Estados".

- Peregrinos?
- Mais ou menos. Não posso deixar de recebê-los, pois fico pensando que vieram de longe e necessitam de consôlo. Isto leva tempo, toma tempo. Como se não bastassem essas preocupações, o telefone interurbano não pára dia e noite.
- "Chico, Rio está chamando... Chico, Belo Horizonte está chamando... Chico, São Paulo está chamando... Chico, Cachoeira está chamando..." Evito atender, mesmo constrangido. Meu Deus! Eu não quero nada, senão a paz dos tempos antigos, o silêncio de outrora. Quero ser de novo aquêle Chico sossegado e tranqüilo que apenas se preocupava com as coisas simples...
- Impossível a viagem de volta...
- Impossível? Não, não é impossível. Eu voltarei a ser aquêle sossegado Chico. Não tenha dúvida.


O repórter imagina, a essa altura, que êle acredita na possibilidade de suas comunicações, com o além serem repentinamente suspensas. Vai perguntar ao Chico, mas uma senhora de côr negra entra na sala, carregando um benjamim de olhos assustados.
- "Trago para o senhor, Seu Chico..."

Êle segura com trinta mãos, cheio de cuidados, o bebê e o bebê faz um berreiro dos diabos, agita as pernas, sacode as pernas dentro da prisão dos braços de Chico. Êle sorri e devolve o menino à mãe.

- Meu sobrinho - explica o profeta Chico - é nervoso e fica dêste jeito. Sabe por que? Êle sofre de paralisia infantil.
- Não tratam dêle?
- Não temos recursos. Já deixei claro que não recebo um centavo pelas edições dos livros que me chegam do além. Assino um documento autorizando a livraria da Federação Espírita Brasileira a editá-los e, sòmente após ficarem impressos, recebo uns cinco ou dez exemplares, para dar aos amigos.

Vamos atravessando a sala e entramos num dos quartos. Na parede, prateleiras repletas de livros. Remédios à base de homeopatia, que Chico recomenda. Não sei porque os espíritos manifestam estranha aversão pela alopatia e suas drogas, receitando sempre combinações homeopáticas. Perto dos vidros, um armário cheio de livros. As obras de guerra conta a Santa Sé, assinadas por Guerra Junqueiro, ainda em vida. Os livros de Flammarion e de Alan Kardec, mas não os psicografados, misturados com volumes de propaganda anticlerical. Na parede, dependurado, um velho pandeiro.

- Quem toca pandeiro nesta casa?
Chico sorri o sorriso beatífico e diz que não é êle.
- Alguns espíritos?
O sorriso beatífico desaparece.
- Os espíritos não tocam pandeiro.


Saímos para a rua, hoje, sábado movimentado. O povo de Pedro Leopoldo passeia diante da Igreja que domina de forma esquisita a casa do humilde psicógrafo que Clementino de Alencar, certo dia, foi roubar de sua vida serena há dez anos. Hoje, Pedro Leopoldo é a Jerusalém do credo de Kardec. Já tem hotel e telefone. O povo de lá, por estranho que possa parecer a quem não conhece pessoalmente o nosso amigo Chico, revela invariável amizade. Será orgulho pela celebridade que êle deu ao município? Sim, porque antes de Chico, Pedro Leopoldo nem existia nos mapas de Minas Gerais. Gostam dêle, de seus modos, de sua cara asiática, onde um dos olhos empalideceu sùbitamente, como um farol apagado em pleno caminho da luz. A cidade tem uns treze mil habitantes, contadas as aldeias próximas, mas, espíritas, uns quatro ou cinco. Todos apreciam Chico, gregos e troianos. Gostam, mas preferem não rezar o seu catecismo. Êle não se importa. Não procura convencer ninguém à fôrça de seu estranho e discutido poder. Quando a carta precatória, intimando-o a depor, chegou a Pedro Leopoldo, Chico leu devagarinho e abanou a cabeça. - "Eu não posso mandar uma intimação judicial às almas!" E não deu mais importância ao caso.


Até à volta, sereno Chico. De tôdas as pavorosas complicações, você é o menos culpado. Parece uma caixa de fósforo num mar bravio. Uma velha beata de Pedro Leopoldo me disse que isto é castigo: - "Castigo, sim, nhô moço... Antão, êle telefona pro inferno e manda chamar os espíritos e depois num quer se aborrecer?"


Já o trombonista de Pedro Leopoldo deve pensar diferente: - "Por que será que o Chico só sabe receber mensagens escritas? Por que não recebe músicas de Beethoven, de Chopin, de Carlos Gomes?"

Êle, o moço amável de Pedro Leopoldo, não dá maior atenção aos comentários e vai levando como pode a sua vida. É pena, entretanto, que êle não tenha as qualidades artísticas que vão além do terreno literário. Se fôsse assim, Pedro Leopoldo teria, senhores, não apenas o psicógrafo Chico, mas também o músico Chico, o pintor Chico, o profeta Chico. Isto mesmo: o profeta Chico.




Imagens: Revista O Cruzeiros e Internet

sábado, 20 de março de 2010

Glauco Villas Boas, do humor ao trágico









Quando tudo parecia estar bem, eis que surge diante de si o deserto do caos. As flores tão mimosas que embelezavam os jardins se rebelam mostrando as farpas do espinheiro sangrento. As florestas que tão bem abrigavam lindos pássaros canoros, de repente ficam entregues às serpentes do mau. Esse universo antagônico mostrando de um lado o bem, do outro esconde o mal traiçoeiro e covarde. Nesse mar profundo da insensatez a confiança é ultrajada sob o domínio do demônio no seu inferno de desequilíbrio. E a vida na procura do sorriso amigo encontra a fatalidade como repouso. Encontra a sombra densa que escureceu o mês de março para a família do Glauco Villas Boas, 53 anos, e também cegou sua arte divertida, sagaz e crítica.

Na madrugada de sexta-feira do dia 12, Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, o Cadu no seu cinismo doentio, eliminou de maneira brutal o cartunista e o seu filho Raoni Villas Boas de 25 anos, em situação bem adversa da estruturada na fé idealizada e construída por ele na busca pelo enriquecimento espiritual compartilhada com a doutrina do Santo Daime. É inegável que sua competência profissional e carismática, fizeram de Glauco um cara que discutia através de suas charges divertidas o dia-a-dia dos indivíduos e da sociedade, destacando suas ansiedades e conflitos sem impor os modelos estigmatizados da perfeição a serem seguidos. Suas criações transcendiam as mesmices alienadas sob o ponto de vista comportamental das pessoas e da modernidade cibernética. Diante de uma situação grotesca imprevisível deparou-se com a fúria insana e destruidora de um comportamento apocalíptico psicodélico que o enviou para mundo dos espíritos. Assim se foi um artista. Um criador inteligente de personagens que durante décadas levou a alegria para muitos brasileiros com seus trabalhos bem humorados retratando o cotidiano, suas transformações e suas neuras.

Descendente de família tradicional de indigenistas, os irmãos Villas Boas, Orlando, Cláudio e Leonardo Villas Boas, engajados na integração do índio sem contaminar sua cultura, nos princípios da isenção de preconceitos e da famigerada exclusão sob todos os níveis, Glauco encarou a estrada das oportunidades como todo novato, indo à busca dos seus ideais acreditando num futuro redentor. Iniciou sua trajetória profissional em 1976, quando publicou o seu primeiro trabalho como cartunista no Diário da Manhã de Ribeirão Preto; em 1977 ganhou o Prêmio do Salão Internacional de Humor de Piracicaba. Com o resultado da sua conquista foi convidado a fazer parte do elenco de cartunistas do jornal Folha de São Paulo, onde consagrou seus personagens e notoriedade nacional com suas criações irreverentes e bem elaboradas o traço enigmático que o personificou. Em l991 participou ao lado de Angeli e Laerte da criação da tirinha “Los 3 amigos”, satirizando os filmes de bang-bang do velho Oeste, com a presença indispensável dos mexicanos e suas indumentárias tradicionais. Também fez parte da equipe de redação dos programas TV Pirata e TV Colosso da Rede Globo.

Seus personagens

Geraldão – Criado em 1981, solteiro de 30 anos, mora com sua mãe em constantes desentendimentos pelos seus costumes pouco recomendáveis de andar pelado pela casa o tempo todo, beber e fumar muito. Quando encontra remédios toma sem nenhuma preocupação.



Casal Neuras – Criado em 1984, trata-se de um casal formado por uma mulher que aboliu a submissão e o marido com pose de liberal curte o seu ciúme na neura.


Doy Jorge – Criado também nos anos 80, destaca um roqueiro mal sucedido que se deixou levar pelas drogas pesadas e suas nóias.


Zé do Apocalipse – O profeta brasileiro



Com Péricles de Andrade Maranhão, o criador do Amigo da Onça não foi diferente, só que ele foi o responsável pela sua própria tragédia pessoal se autodestruindo pelo seu livre arbítrio. Depois de 30 anos de pleno sucesso profissional, vários prêmios e vendo a vida descambar para a boemia desregrada, solidão e depressão, provocou suicídio. Abriu o gás do seu apartamento e ficou esperando a morte chegar. Mesmo determinado a morrer não descuidou da sua maneira humorada de ver os fatos. Teve o cuidado de escrever um aviso “Não risquem fósforos” que foi afixado na porta.

Após sua morte Carlos Estevão também seu amigo, continuou desenhando as charges na tentativa de manter viva a imagem do personagem sem, contudo, alcançar o mesmo sucesso conquistado pelo seu idealizador que se tornou a sua própria identidade. Poucas pessoas o chamavam pelo nome Péricles, era conhecido mesmo como o criador do Amigo da Onça.


Péricles nasceu no bairro Espinheiro, no Recife em 14 de agosto de 1924, faleceu no Rio de Janeiro em 31 de dezembro de 1961. Sua primeira charge foi publicada no Diário de Pernambuco. Foi presença marcante em O Cruzeiro de 1943 a 1962. Chegou ao Rio conduzindo uma carta de apresentação de Leão Gondim de Oliveira o manda chuva dos Diários Associados, a mais poderosa rede de comunicação do país na época. Em 1942 estreou no Diário da Noite com o personagem “Oliveira, o trapalhão”. Em 1943 já em O Cruzeiro criou o que considerava o verdadeiro estereótipo do malandro carioca: baixinho, cabelos penteados para trás à base de gumex, Summer jacket, bigodinho safado e olhar de peixe morto. Sua missão espontânea consistia em sacanear as instituições estabelecidas fundamentadas no casamento, exército e na hipocrisia social comum entre as classes sociais predominantes, principalmente entre as elites.

A ideia que deu origem ao Amigo da Onça surgiu a partir de uma piada muito apreciada e comentada entre a população carioca do momento. Cabendo a Leão Gondim o batismo do personagem.

Dois caçadores conversam em seu acampamento:
- O que você faria se estivesse agora na selva e uma onça aparecesse na sua frente?
- Ora, dava um tiro nela.
- Mas se você não tivesse nenhuma arma de fogo?
- Bom, então eu matava ela com meu facão.
- E se você estivesse sem facão?
- Apanhava um pedaço de pau.
- E se não tivesse nenhum pedaço de pau?
- Subiria na árvore mais próxima!
- E se não tivesse nenhuma árvore?
- Sairia correndo.
- E se você estivesse paralisado pelo medo?
Então, o outro, já irritado, retruca:
- Mas, afinal, você é meu amigo ou amigo da onça?


De forma lamentável a história do riso escreveu em suas páginas o final trágico de dois ícones do humor brasileiro.

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Imagens: Site Memória Viva e Internet



quinta-feira, 11 de março de 2010

Raquel de Queiroz, o drama da África do Sul


O drama da África do Sul


Este artigo foi publicado na revista O Curzeiro em 7 de maio de l960. A escritora Raquel de Queiroz em sua coluna "Última Página" não poupa sua indignação à segregação racial imposta pela Apartheid na África do Sul (1948 - l990). Fala sobre política racial, discriminação, racismo e intolerância. Condena o poder totalitário do ditador portugues Salazar e de Hitler na Alemanha.
Bússola Literária se orgulha de estar reeditando de forma histórica, na íntegra ao original, mantendo inclusive as mesmas regras ortográficas da época.

Créditos: Artigo extraído do link O Cruzeiro, dos arquivos do Blog Lei Seca de Luiz Augusto.


Já tenho ouvido de muito brasileiro ingênuo ou mal-aprendido o comentário de que foi uma pena não se terem os flamengos fixado definitivamente no Brasil. Ah, outro galo nos cantara! Teríamos progresso, futuro e não êsse descalabro ibérico que nos legou a colonização portuguêsa...

Pois isso que agora acontece na África do Sul é uma amostra do que seria de nós se a insurreição pernambucana não houvesse pôsto fora do Nordeste o invasor holandês. Flamengo pode ser muito bom na terra dêle. (Não posso dizer a frase corriqueira - que êles podem ser bons para as negras dêles, porque é para as negras dêles, evidentemente, que êles são péssimos,...) Flamengo tem altas virtudes, mas é um fato que sua atuação colonial durante mais de três séculos e em vários continentes demonstrou que êle não sabe conviver em harmonia com povos de origem racial diferente da sua. E eis por que tenho um certo mêdo dessas colônias holandesas que ora se estabelecem no Brasil. Muito boas, muito limpas, muito trabalhadeiras - mas não se estará formando em cada uma delas um quisto racial insolúvel, uma minoria intolerante e inassimilável?

Ontem alguém perguntava: que é que faz com que um povo aparentemente instruído, polìticamente adiantado, acredite estùpidamente que nasceu para senhor, que a côr da sua pele e a conformação do seu nariz o fadam a desprezar e escravizar outros homens que têm pele e nariz diferentes? A resposta é simples: um dos aspectos mais invariáveis da natureza humana e a capacidade de acreditar sinceramente e até mesmo fanàticamente, naquilo que lhe convém. Se eu preciso de um negro para trabalhar no meu roçado ou na minha mina, imediatamente me convenço que o bem e o destino do negro não é vaguear à toa nos matos, mas plantar a minha cana ou cavar a minha mina. Para a mina ou para o eito é que Deus o pôs no mundo, não para uma inútil liberdade.

Graças a êsse mecanismo da mente humana, as maiores monstruosidades se praticam - e sinceramente - em nome do bem. Êsse horrendo Hendrik Verwoerd, com as suas duas balas encravadas no rosto, provàvelmente se considera o mártir de uma causa santa. Todos sofremos a necessidade instintiva de praticar coisas certas, ou pelo menos de receber a aprovação da demais Humanidade, ante o que praticamos. Assim, se eu exerço um ato de violência contra outro ser humano, a minha censura, a minha consciência, o meu anjo-da-guarda, seja lá o que fôr, imediatamente me acusa pelo crime cometido. E eu, então, que não quero renunciar às vantagens da minha violência, mas também não quero ser chamado criminoso, invento para minha justificativa um motivo irretorquível, retumbante, se possível de caráter religioso, e portanto irrespondível, sob pena de sacrilégio. No caso do negro, falado acima. Em vez de reconhecer que o escravizo, convenço-me de que o negro é um irresponsável, incapaz de viver sem a minha ajuda; o trabalho a que o forço é a disciplina indispensável ao seu próprio bem; sôlto, êle ficaria entregue à miséria, à bebida, ao pecado. No fim acabo me proclamando a benfeitoria do negro, destinada por Deus à sua salvação... Uma vez convencida disso, torno-me invulnerável. Crio mesmo um dogma em tôrno daquela convicção. Se sou govêrno, crio lei a respeito e faço ampla catequização. E todos os que se beneficiam do meu regime passam também a acreditar fanàticamente, e, o que é pior, sinceramente, na honestidade dos nossos postulados.

Se não fôsse artifício da mente humana, muito mistério social não teria explicação. Êsses brancos da África do Sul, que friamente fazem massacrar negros desarmados, provàvelmente não são assassinos contumazes; talvez até sejam bons pais de famílias e tementes do que êles consideram a lei de Deus. O Sr. Jânio Quadros, comentando outro dia o drama da África do Sul, disse numa frase generosa que não compreendia como é que naquela terra havia igrejas. A mim parece que a explicação é esta: êles se convenceram do seu direito divino sôbre os negros, convenceram-se de que a Providência os destinou a oprimir e explorar aquela raça nascida para serva dos brancos. E, em vista disso, sentem-se em paz consigo, e ainda pedem trôco a Deus pelas suas boas obras. Fenômeno idêntico explica por que o Sr. Salazar, homem de rígida formação religiosa e celebrada moral privada, chefia uma ditadura de opressão e impostoria; é que Salazar se convenceu de que é o desejado, o Messias da gene portuguêsa. E quem se revolta contra a pessoa ou os privilégios do salvador é culpado não de oposição a um homem fanático e mau, mas de atentado contra a própria nacionalidade. Assim se justificaria Hitler nos paroxismos da sua loucura assassina; assim se justificam os brancos racistas dos Estados Unidos. Isso explica por que nas guerras ambos os beligerantes estão certos de que Deus está do seu lado.

Aliás, assim também se justifica qualquer criminoso.

Todos têm a sua alegação perfeita. Ninguém diz que matou ou roubou porque é mau, degenerado ou louco. O sujeito que isso confessasse a si mesmo, provàvelmente se suicidaria: dentro de tal evidência ser-lhe-ia impossível continuar a viver consigo próprio.
Foi o que aconteceu com Judas, entre outros.

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Imagens: Internet

quinta-feira, 4 de março de 2010

Austragésilo de Athayde, a saga do liberal



A saga do liberal

Biografia conta como Austragésilo de Athayde
deixou sua marca na democracia brasileira.


O objetivo desta publicação não é o de promover o passado e o
presente do escritor - até sua morte em 1993 aos 98 anos -,
mas evidenciar suas posições sobre assuntos
de interesse social e político do País, como intelectual
que esteve à frente da ABL-Academia Brasileira de Letras
por mais de 30 anos.
Artigo extraído da Veja de 23 de setembro de 1998,
pág. 150, autor Diogo Mainardi.


No início dos anos 20, o pernambucano Austregésilo de Athayde, então um jovem que tentava a sorte no jornalismo carioca, ouviu várias vezes um mesmo conselho do já famoso escritor Lima Barreto. Dizia-lhe que abandonasse a ideia de trabalhar apenas em jornais, profissão que não dava dinheiro, e tratasse de conseguir um cargo público para viver mansamente à custa do Estado. “Faça como Machado, Bilac e Coelho Neto – compareça à repartição só no fim do mês para pegar o dinheiro”, recomendou o autor de Policarpo Quaresma. Athayde jamais lhe deu ouvidos, e quem ganhou com isso foi o Brasil. Nas décadas seguintes, Athayde se tornou uma das vozes mais influentes da democracia nacional e um atilado analista dos acontecimentos mundiais. Com seus artigos diários em jornais e revistas, publicados até pouco antes de sua morte, em 1993, aos 98 anos, esteve sempre pronto a brandir seu ideário liberal contra as opressões, as ditaduras e toda forma de cerceamento das liberdades individuais e de imprensa. Como eterno presidente da Academia Brasileira de Letras, que comandou por mais de trinta anos, tornou-se também personagem lendário e, não raro, folclórico no mundo literário.


Agora, pela primeira vez, a trajetória de Belarmino Maria Austregésilo de Athayde é contada em livro. Sua filha, Laura Constância A. A. Sandroni, e o marido, o jornalista Cícero Sandroni, acabam de lançar Athayde – O Século de um Liberal (Agir; 810 páginas; 45 reais). A obra é uma biografia feita a partir do portentoso arquivo montado durante décadas por Maria José, a “Jujuca”, mulher de Athayde e mãe de Laura. Jujuca colecionava meticulosamente todos os artigos escritos pelo marido, sua correspondência e as notícias que a imprensa publicava sobre ele ou sobre o casal. Muitos desses artigos são reproduzidos no livro, devidamente acompanhados do contexto em que foram escritos. O resultado é uma História do Brasil e do mundo no século XX contada pela ótica de um observador arguto. A obra também procura desmistifica algumas lendas a respeito de Athayde, como a de que ele teria apoiado incondicionalmente o golpe militar de 1964. Os artigos de época mostram que ele realmente apoiou o levante militar como forma de evitar a baderna na vida nacional, mas apenas três dias depois já reclamava a devolução do poder aos civis.

A biografia também resgata histórias curiosas e divertidas protagonizadas por Austregésilo de Athayde, como sua campanha contra a construção da estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro. “Por que obrigar o Cristo a ser o guarda-noturno dessa Sodoma incorrigível?”, perguntava ele em 1921. Abordando episódios mais recentes, o livro conta como ele ficou furioso quando suas economias da vida inteira foram confiscadas pelo então ex-presidente Collor. Por coincidência, o primeiro pagamento que Athayde recebeu por um artigo, escrito para o jornal carioca A Tribuna, foi-lhe entregue pelo avô do ex-presidente, o também jornalista Lindolfo Collor, diretor da publicação. Dias depois do confisco, Athayde aliviou a bílis com a ministra de Collor, Zélia Cardoso de Mello. Ambos se encontraram no show de Paul McCartney, no Rio de Janeiro. Puxando conversa, Zélia chamou a atenção de Athayde para ao fato de que todos no Maracanãzinho estavam dançando ao som do ex-beatle. “Ministra”, devolveu o jornalista, “quem fez o Brasil dançar foi a senhora, não ele.” Humor admirável para um nonagenário.



À sombra do islã


A literatura nos países muçulmanos continua viva,
apesar da opressão político-religiosa.


Tem curiosidade de conhecer como é conduzida a
liberdade de expressão literária nos países islâmicos?
Então leia este artigo extraído da Veja de 2 de fevereiro de 2000,
págs. 152/153, autor Carlos Graieb.


No começo do século XVIII, um livro incendiou a imaginação dos ocidentais. Ele chamava As Mil de Uma Noites. Quem primeiro o traduziu do árabe foi o estudioso francês Antoine Galland, que retornou de uma viagem a Istambul trazendo na mala um exemplar do texto. Publicados entre 1707 e 1717, os doze volumes dessa tradução conquistaram desde cedo legiões de admiradores. O mundo árabe e adjacências se transformaram na terra das maravilhas. Hoje, passados três séculos, pouco resta dessa imagem. Gênios e odaliscas foram substituídos, no pensamento ocidental, por xeques do petróleo, mulheres de véu negro e fanáticos religiosos que aparecem na televisão. Curiosamente, no entanto, as histórias narradas por Sherazade continuaram sendo as únicas, de toda a literatura árabe ou muçulmana, conhecidas na Europa e nas Américas. Tudo se passa como se não houvesse escritores por lá. Mas eles existem. E vêm produzindo obras de grande valor, mesmo quando precisam desafiar a opressão política, a censura religiosa ou a pobreza.


Recentemente, alguns ficcionistas chegaram ao mercado brasileiro com o selo da editora Record. Do libanês Amin Maalouf temos Jardins de Luz, que fala sobre o fundador da religião maniqueísta. Já o marroquino Tahar Bem Jelloun em, Os Frutos da Dor, descreve a situação dos imigrantes islâmicos na França, escolhendo como narradora uma jovem que precisa enfrentar tanto o racismo dos europeus quanto as superstições de seu próprio povo. Por fim, o paquistanês Tariq Ali reconstitui de maneira empolgante em, O Livro de Saladino, a época das cruzadas sob o ponto de vista muçulmano. São três ótimos romances, diferentes entre si, que “desafiam os preconceitos do leitor ocidental” – para usar as palavras de Ali. Nenhum desses autores, porém, vive em seu país de origem. Os dois primeiros moram na França e publicam em francês, enquanto o último mora na Inglaterra e publica em inglês, por causa disso, não representam à perfeição a atual cultura da região. É preciso ir às fontes.

Uma primeira surpresa, para quem começa a investigar o assunto, é descobrir que a literatura dessa parte do mundo vive num feliz estado de efervescência. Inaugurada na semana passa, (anterior a 2 de fevereiro de 2000) a Feira do Livro do Cairo, no Egito, dá uma idéia da agitação. Um total de 79 países participa do evento de 25 mil títulos estão em exibição. “Nossa literatura não tem do que se envergonhar, seja em quantidade, seja em qualidade, afirma o contista egípcio Bahaa Taher (que traduziu O Alquimista, de Paulo Coelho, para o árabe). “Mesmo no romance, uma forma literária que só chegou por aqui há 100 anos, quase todos os países contam com grandes nomes. Azar do Ocidente, que ainda não os descobriu.” A julgar pelos dois autores árabes de maior renome internacional. Taher tem mesmo razão. O egípcio Naguib Mahfouz, ganhador do Prêmio Nobel de 1988, é um genial retratista do Cairo. Já o saudita Abdelrahman Munif é responsável pela monumental trilogia Cidades de Sal, que fala sobre os dilemas de um país que se moderniza depois de descobrir petróleo.

“Sexo e álcool” – A falta de divulgação, entretanto, está longe de ser o maior problema desses escritores. Um levantamento realizado em 1999 pela PEN International, entidade que congrega literatos do mundo todo, mostra que setenta intelectuais foram mortos, encarcerados ou desapareceram nos últimos anos em países de maioria islâmica. Por certo, existem diferenças entre essas nações no que diz respeito à liberdade de expressão. No Marrocos, onde um regime democrático lançou raízes nos últimos dez anos, a censura veio ao chão. Em outro extremo acha-se o Irã, dominado pelo fundamentalismo, “Romances iranianos não podem ter cenas de sexo ou mencionar bebidas alcoólicas”, diz a iraniana Azar Nafisi, professora de estudos culturais da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos. “A repressão é tão intensa que os escritores se autocensuram, temendo represálias das autoridades.” Azar conta que todos os meses recebe uns dez livros clandestinos de jovens compatriotas que não conseguem ser ouvidos em seu próprio país. “O assombroso é que eles são muçulmanos sinceros, que não desejam ofender sua religião.” Por fim, há os casos intermediários. O próprio Egito, um grande centro de difusão cultural, não vive em regime de liberdade plena. Um governo autoritário controla a imprensa e as editoras. Como se não bastasse, grupos fundamentalistas perseguem os escritores. Até Naguib Mahfouz foi vítima de um atentado. Em 1994, um fanático o esfaqueou no pescoço, por achar que seus livros ofendem o islã.

Por que, então, muitos outros autores não seguem os passos daqueles que se mudaram para o Ocidente? Por que Mahfouz, apesar da ameaças e da fama que desfruta, continua vivendo no mesmo bairro onde sempre morou? “Ao contrário do que se pensa o fundamentalismo e o autoritarismo não são traços imanentes de nossa cultura”, acredita o filósofo Mohammed Abed AL-Jabri. “Ambos são produto de uma distorção.” Considerado o mais importante pensador marroquino da atualidade, Al-Jabri é autor de um Best-seller no Oriente, Introdução à Crítica da Razão Árabe, lançado no Brasil pela editora UNESP. Seu principal objetivo é reviver o que chama de vertentes racionalistas da cultura árabe. “O pensamento árabe contemporâneo pode recuperar e reutilizar os ensinamentos racionais e liberais de sua própria tradição - a luta contra o feudalismo e o misticismo, a vontade de instaurar uma Cidade da razão e da justiça”, escreve ele. Esse projeto está inscrito nas obras que acabam de sair no Brasil. Vale a pena conferir.

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E o site da Juju Descobrindo Outro Mundo, já o acessou? Se eu fosse você iria conferir imediatamente. Acesse: www.admiraveljuju.com.br 


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